Castelmoron-d'Albret, 22 de abril de 1922. Sem Logos. O mundo é eterno ou não? O planeta ocupa o centro do universo pois o centro é sempre onde estamos... > Lire la suite
Castelmoron-d'Albret, 22 de abril de 1922. Sem Logos. O mundo é eterno ou não? O planeta ocupa o centro do universo pois o centro é sempre onde estamos e pensamos, mais do que estamos, somos. E o cosmo que existe não se estende além do limite de nossa percepção convexa, nossa percepção dá a forma do que conhecemos e, fora dela, há o vazio (desconhecido) ilimitado, a ser percebido e enquanto não percebido, pressentido, incorpóreo e, por isso, capaz de receber corpos. Assim é o espaço quase nas palavras de Aristóteles, traduzido superficialmente para o latim (spatium est capacitas recipiendi corpora). Mais coerente seria dizer que o cosmo, o todo, o universo é uma sympátheia tôn hólôn, uma "simpatia entre todas as coisas", e que tudo está unido por uma lei de afinidade recíproca e causal, todas as coisas são partes de um grande organismo. Mas essa é nossa compreensão do cosmos. É só uma visão senciente que define a forma de ser conforme a forma de ver. A aparência é transparente. O fluir é opaco. Ao escrever estas linhas resolvo minha memória de ser e descobrir quem sou. Conecto-me ao tecido nervoso da realidade onde as mesmas estrelas se refletem nas águas de milhares de planetas cheios de vida. Mas ao me identificar com o todo esqueço de mim como essência e passo a ser instante do fluxo. E minhas vidas se misturam. O caderno é de quando fui poeta em Berlim. A caneta é de quando fui metafísico em Angola. O relógio ganhei de uma esposa na Irlanda. O tablet eu montei no Japão e o relógio... o relógio, não me lembro. Fragmentos persistentes. Há livros infinitos dentro. Um dentro onde cabe o infinito em plural. É assim que acontece. A omnisciência é impossível pois elimina a existência múltipla. E quando estaciono de repente, paro assim perdido no tempo e no espaço com restos de vidas minhas e alheias, alheias agora, de antes ou depois. Fujo da omnisciência em nome da existência dos todos. Escrevo então. Linhas misturadas em um velho caderno. Idiomas diversos ou únicos. Não faz diferença. Transmigro. A palavra cria o fluxo, e fluxo gera um sentido, vetor existencial para o que chamo de mim e para o continuum. Um logos. Faço-me carne e existo. E assim o universo persiste. Sem motivo senão existir. Fiat Lux. Mi premis la butonon kaj la libro eliris.